Ativismo caminha a passo lento no mercado de ações

Ativismo caminha a passo lento no mercado de ações

Assembleias de acionistas costumam ficar vazias no Brasil, diz Mauro Cunha, da Amec

O ESTADO DE S. PAULO
05 Abril 2016 | 05h 00 – Atualizado: 05 Abril 2016 | 05h 00

Especialistas acreditam ser necessário um conjunto de fatores para aumentar ativismo de acionistas: mais conhecimento, governança e evolução do mercado

Após um escândalo de corrupção e um desastre ambiental, Petrobrás e Vale, respectivamente, têm sofrido perdas e até processos nos EUA. No Brasil, porém, não há ação judicial dos acionistas contra elas, o que mostra que a existência do investidor engajado ainda é uma realidade distante no País.

Em janeiro deste ano, entrou em vigor para empresas de capital aberto, ainda de forma opcional, a instrução da 561 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que regulamenta o voto à distância em assembleias. A medida promete facilitar a participação dos acionistas e impulsionar o ativismo.

“Como vivemos um momento de expansão econômica em meados dos anos 2000, muitos investidores foram conhecer os investimentos em ações, visando ganhos maiores, mas sem dominar, de fato, as nuances desse mercado” aponta Luiz Marcatti, sócio da consultoria Mesa Corporate Governance.

Para o especialista em fusões e aquisições Robertson Emerenciano, sócio do escritório Emerenciano, Baggio e Associados – Advogados, a experiência internacional mostra a necessidade da cultura de governança e compliance, em todos os níveis hierárquicos da empresa, “desde o acionista até o nível mais inferior da operação, aplicáveis e exigíveis vertical e horizontalmente na empresa.”

O presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) Mauro Cunha, sinaliza que, enquanto essa cultura não for implementada, as empresas nacionais continuarão sendo prejudicadas. “Chegou a hora de nos mirarmos nos países desenvolvidos, criando um Código de Princípios para reverter este quadro”, propõe.

Para Cassiano Morelli, da Claritas Investimentos, o caminho do ativismo depende da evolução do próprio mercado de ações: “No cenário atual, a migração para a renda fixa tem atrasado esse amadurecimento”, diz.

Casos de corrupção exigem mudanças radicais nas empresas

Casos de corrupção exigem mudanças radicais nas empresas

Após protagonizar escândalo mundial de corrupção em 2007, Siemens se tornou referência em compliance

RAQUEL BRANDÃO – O ESTADO DE S. PAULO
12 Abril 2016 | 05h 00 – Atualizado: 12 Abril 2016 | 10h 45

Assumir o erro, criar programa de fiscalização e agir com rapidez são passos essenciais para recuperar a credibilidade

Reformular-se. Essa foi a medida adotada pela Siemens após protagonizar um dos maiores escândalos de corrupção da Alemanha. Investigada por autoridades do seu país e dos EUA, a companhia pagou, em 2007, uma multa de US$ 1,6 bilhão por subornar autoridades de diversos países para conseguir contratos atrativos. Nesse mesmo ano, a empresa tomou um importante passo: consolidou seu departamento de governança corporativa e adotou um sistema de compliance bem estruturado.

Além do pagamento da multa, alguns passos foram adotados. A Siemens colaborou com as investigações das autoridades, afastou funcionários corruptos e assumiu um programa de fiscalização e regras. Tais medidas fizeram com que a empresa se tornasse um modelo de governança corporativa, mesmo após o escândalo. “Não tivemos vergonha de assumir nosso erro, o que talvez seja um dos grandes desafios do mercado brasileiro”, pontua Reynaldo Goto, diretor de compliance do grupo no Brasil, onde fraudes em contratos de trens de São Paulo foram descobertas em 2013 e denunciadas ao Ministério Público.

Estratégia semelhante tem sido tomada pela Petrobrás, cujos contratos e membros são investigados pela operação Lava Jato. Em 2015, a diretoria de Governança, Risco e Conformidade foi criada e em dezembro do mesmo ano o hotsite “Daqui pra frente” foi lançado para executivos responderem aos principais questionamentos do público. A estatal também realiza pesquisas com o público externo. “Os resultados apurados contribuem para nortear as ações da companhia em busca da recuperação de sua imagem”, afirma a empresa.

Recuperação. Mas voltar a ter credibilidade não é uma tarefa fácil nem rápida. “A empresa pode errar, mas o que determina se ela vai resistir é como se comporta durante e depois da crise”, explica o professor de Gestão de Crise da ESPM, Leonardo Mancini.

A primeira coisa a se fazer é investigar, preferencialmente com equipes independentes. “Um escândalo é um tipo de crise diferente. É importante investigar antes para não passar qualquer informação equivocada”, diz Renato Franco, sócio da consultoria Íntegra Associados, responsável pela recuperação da Parmalat Brasil. Irregularidades cometidas pela empresa italiana se tornaram públicas em 2003.

“Concomitante à apuração, é preciso um melhoramento das medidas de governança. É primordial fazer uma análise de riscos, tanto do que aconteceu como do futuro”, diz Alessandra Gonsales, advogada especializada em compliance e sócia do escritório WFaria. “O compliance é contínuo, pois o fraudador sempre busca outras formas.”

O afastamento dos envolvidos também é fundamental, segundo os especialistas, para resgatar a credibilidade. Mas muitos desafios se sobrepõem, como lidar com os nervos da equipe, que teme demissões, e dos acionistas, que se preocupam com a rentabilidade dos seus investimentos. “Além de informar os fatos relevantes, é importante a empresa mostrar aos acionistas que ela está se mexendo”, diz Alessandra.

“A única coisa que diminui a ansiedade e a queda das ações é a melhora da percepção, além de rapidez e clareza nas informações”, afirma Franco.

Mais do que tudo, a empresa precisa se reavaliar. “É preciso olhar para dentro e redescobrir seus potenciais e trabalhar nisso”, destaca o diretor da Siemens.

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